Os chips que podem revolucionar a pesquisa médica e diminuir uso de animais de laboratório
Quando Ken-Ichiro Kamei, engenheiro da Universidade de Kyoto, sai
para beber com seus amigos, ele geralmente leva consigo um de seus "corpos
em um chip". Quando o tema do trabalho inevitavelmente surge, ele pega o
chip – que se parece a uma lâmina de laboratório, com minúsculos canais
cobertos por uma camada de silicone – e declara: "Faço estes dispositivos
para recriar humanos e animais".
Reações de surpresa inevitavelmente
surgem. "É como se eu fosse um mágico e meus amigos me pedissem para fazer
truques", Kamei ri.
Kamei está na vanguarda de um novo campo da biotecnologia que busca
replicar órgãos, sistemas e corpos em formato de chips. Enquanto experimentos
bioquímicos realizados em placas tradicionais são estáticos e isolados, os
chips usados por Kamei têm um sistema de canais, válvulas e bombas que permitem
interações mais complexas - a ponto de poderem imitar a fisiologia de um sistema
vivo.
Reconhecendo o potencial que tais chips têm de revolucionar a pesquisa médica, o Fórum Econômico Mundial apontou os "órgãos em chips" como uma das dez tecnologias emergentes mais importantes de 2016. Mas se chips especializados imitam determinados tecidos ou órgãos, Kamei e seus colegas pretendem imitar animais inteiros. "É bastante ambicioso", admite.
Kamei constrói seus próprios chips em laboratório, usando um cortador a laser e uma impressora 3D. Para operá-los, ele adiciona tecidos celulares em seis câmaras conectadas a microcanais. Em seguida, conecta microbombas pneumáticas a um controlador para criar um circuito. Isso permite a Kamei e a outros pesquisadores testar a eficácia e os efeitos colaterais de novos medicamentos, desenvolver a medicina personalizada com base nas células de indivíduos específicos e entender melhor a base de diversas doenças.
Em um experimento, por exemplo,
Kamei e seus colegas colocaram no chip células saudáveis do coração e células
cancerosas do fígado. Eles então adicionaram doxorrubicina, uma droga de
combate ao câncer conhecida por causar efeitos colaterais tóxicos no coração,
mas cujo mecanismo de toxicidade era desconhecido. Os pesquisadores descobriram
que a droga não causou diretamente o dano cardíaco; o subproduto metabolizado
pelo fígado o fez.
Abastecimento de células
Tais experimentos requerem um amplo abastecimento de várias células.
Isso não teria sido possível sem o trabalho de Shinya Yamanaka, pesquisador de
células-tronco da Universidade de Kyoto que ganhou o Prêmio Nobel de
Fisiologia/Medicina em 2012. A honraria foi concedida por sua criação das
células-tronco pluripotentes induzidas (iPS, na sigla em inglês).
"As células iPS podem se proliferar muitas e muitas vezes fora do corpo, enquanto outros tipos de células-tronco não podem", diz Kamei. "Além disso, as culturas celulares usadas anteriormente eram provenientes de apenas uma pessoa, o que não era útil para estudar doenças genéticas ou de outro indivíduo".